A corrida contra o vírus SARSCoV-2 continua e conta agora com uma ajuda da natureza: cientistas do Instituto de Química da Unesp, em Araraquara (SP), descobriram uma molécula do veneno da jararacuçu (Bothrops jararacussu) capaz de inibir a ação do coronavírus.
Durante estudos feitos em laboratório, os especialistas aplicaram um pedaço da proteína do veneno em células de macaco e constataram que a capacidade do vírus se reproduzir caiu 75%. Os resultados são promissores para outras pesquisas e até para a produção de medicamentos indicados no tratamento de pessoas infectadas – próxima desafio para os cientistas.
Além de cientistas da Unesp, o trabalho envolveu pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
A jararacuçu (Bothrops jararacussu) ocorre na Mata Atlântica de baixada, entre 0m a 700 metros de altitude, desde o sul da Bahia até o Rio Grande do Sul. Fora do País também pode ser encontrada na Argentina, Bolívia e Paraguai. “Ela habita ambientes mais florestais, onde tenha um dossel mais denso e o solo com bastante serapilheira e troncos caídos. Essas estruturas formam tocas e esconderijos perfeitos para descansarem”, comenta o biólogo e cinegrafista de natureza, Rafael Mitsuo.
Considerara a segunda maior serpente peçonhenta do Brasil – atrás apenas da surucucu-pico-de-jaca; a espécie impressiona pelo tamanho. “Maiores e mais robustas, as fêmeas podem chegar a mais de dois metros de comprimento”, destaca.
De acordo com o biólogo, a espécie ainda não é considerada ameaçada de extinção. “Mas com o avanço da fragmentação da Mata Atlântica, é questão de tempo até ser considerada criticamente ameaçada”, lamenta Mitsuo.
Predadora de pequenos mamíferos, marsupiais, anfíbios e lagartos, as jararacuçus podem ser predadas (quando filhotes) por gambás e roedores. Quando ficam adultas, porém, afastam a maioria dos predadores. “Pode até ocorrer predação por gambás e aves de rapina, mas são eventos raros”.
Veneno potente
Mesmo antes da descoberta dos pesquisadores, o veneno da espécie já era conhecido pela potência. “O veneno da jararacuçu é um pouco diferente das outras espécies do gênero, pois possui uma ação miotóxica mais expressiva, ou seja, atinge os tecidos musculares com mais força, dando início ao processo de necrose. Caso não seja administrado o soro antiofídico a tempo, isso pode levar à amputação do membro atingido”, explica o biólogo, que apesar das características da peçonha, faz um alerta importante: não há motivos para temer o animal, muito menos caçá-lo.
“A produção de peçonha demanda muita energia, então ela não pode se dar ao luxo de usar esse líquido precioso em qualquer ocasião. Ela usa principalmente para caçar, já que a energia que ela gastou vai ser “devolvida” em forma de alimento. Porém, em casos extremos, ela também usa o veneno para defesa. Afinal, ela também quer se manter viva”, diz.
O melhor remédio sempre é a prevenção, e a prevenção nesse caso é respeito. Se encontrar uma jararacuçu na sua propriedade, se esforce para entender que, se pudessem escolher, elas não estariam ali. Ligue para um órgão ambiental imediatamente para que recolham o animal com segurança e o soltem onde seja seguro para todos
Em casos de acidentes com humanos, ele destaca. “Temos soros antiofídicos extremamente eficazes à nossa disposição em vários hospitais graças aos nossos pesquisadores. Se administrados a tempo, as chances de ter sequelas da picada são quase nulas”.
Outra curiosidade da espécie é a grande quantidade de peçonha que inocula na presa. “Existe registros de extração de até 6,8ml de veneno de um fêmea em uma única etapa”, diz.
A jararacuçu pertence ao gênero Bothrops, que inclui outras espécies de jararacas facilmente confundidas por leigos. “Elas dividem mais ou menos as mesmas cores, e até o padrão de desenho pode ser confundido em alguns casos. Mas se prestarmos bastante atenção, a jararacuçu tem desenhos únicos ao longo do corpo”, destaca Rafael.
Por G1
Foto: Rafael Mitsuo
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