Nesta quarta-feira, 08, foi aberta no Museu Casa Guimarães Rosa a exposição Janelas para os sentidos: sertão, apresentada pelo Museu, Cemig e Governo do Estado de Minas Gerais.
“Um grande sertão! Não sei. Ninguém ainda não sabe”, adverte Riobaldo, em Grande sertão: veredas. Por meio da busca do jagunço-narrador, personagem de Guimarães Rosa, o leitor é alçado a uma experiência dos sentidos e um convite a uma abertura para as potencialidades que emergem dos signos.
Patrocinada pela CEMIG, a exposição Janelas para os sentidos: sertão que está em cartaz no Museu Casa Guimarães Rosa situado em Cordisburgo MG, são janelas que se abrem em processos de descobrimentos, travessias, experimentações. Intuir o sertão ultrapassa a cognição e a orientação do dicionário – leva-nos ao interior das casas sertanejas, em que a sala se espreita pela tênue luz que entra pela frincha da porta e se põe sobre a mesa o café coado e a prosa lenta. O sertão evoca os falares e os sentidos, modos em que o homem vê e percebe o mundo a seu entorno, numa apreensão para além da geografia. As janelas são aberturas ao sensorial, ao descobrir-percebendo, ao ser desvelando-se.
Sob outro aspecto as janelas para os sentidos, evocadas pelo título da exposição, apontam para a construção de sentido. O sertão aqui avança suas raízes para o amalgama que constitui o sujeito. A cultura familiar, as paisagens vividas ou intuídas. Sotaques, sons, cheiros, gostos, texturas, luzes, formas que se entrelaçam entre o imaginário e o vivido; entre o herdado e o apropriado, como raízes que se espalham tomando conta do corpo poético do sujeito. Veias, nervos, irrigações vitais que de alguma forma se revelam no corpo das obras como algo que que as constitui, para além da forma ou do conteúdo.
Ao convocar várias vozes de escritores com raízes fincadas no sertão de Minas Gerais, coloca-se em cena as experiências miúdas, pinçadas do cotidiano, centradas na relação do homem com aterra, com o outro, consigo mesmo. Abrindo janelas que são convites, onde o mundo do exterior e do interior se confabulam, trocam-se, intuem-se.
Afonso Arinos (Paracatu, 1868- Barcelona, 1916), Manoel Ambrósio de Oliveira (Januária, 1865-1947), João Guimarães Rosa (Cordisburgo, 1908- Rio de Janeiro, 1967), Lúcio Cardoso (Curvelo, 1912- Rio de janeiro, 1968), Maria Helena Cardoso (Diamantina, 1903- Rio de Janeiro, 1997) e Petrônio Braz (São Francisco, 1928) são intérpretes da experiência de ver-buscar-intuir o sertão. Seus escritos são pegadas nas paisagens do sertão; deslocam-se das definições, evocam sensações. São escritores-sertanejos com raízes sertanejas, diferentes entre si, que falam de um sertão, vivido ou herdado pelas cultura familiar, e permitem que o sertão, em sua potência-viva, se revele.
Intuir é sentimento, pressentimento. Ouvir, ver e perceber o mundo de fora, para buscar, com nova oitiva, o mundo de dentro. Por meio das janelas, apre(e)nde-se um sentido de paisagem que é parte e todo desse mundo: um grande sertão.
Abrir as janelas é permitir que as histórias e os personagens que povoam os livros nos falem desse existir-sentir, centrados nas referências que compõem a mesa, a lida cotidiana, a busca e o desamparo que vige no homem- humano. Os livros são também janelas de espreitar a vida.
Os autores que guiam essa exposição não definem o sertão. Não o determinam, não o nomeiam – eles nos guiam pela experiência do entrar pelo “sertão adentro”, que se ausculta no pio do pássaro, nas batidas do monjolo e no chiado das panelas, na trempe do fogão e no silêncio. Sertão – lugares de começos e chegadas, não-lugar: vivência.
O propósito dessa curadoria que ficou a cargo de Andrea Xavier de Paula Vilela, Fabiano Lopes de Paula, Ivana Ferrante Rebello, João Caixeta com design de André Jullien foi o de secundar as indagações de Riobaldo, perpetuando seu espanto e sua busca: “Quase que nada sei, mas desconfio de muita coisa”. Assim como Rosa, Ambrósio, Arinos, Braz, Lúcio e Maria Helena.
As janelas permitem, ainda, a uma ressignificação do mundo, ainda imerso na pandemia, que nos obrigou à ocultação e ao fechamento. Essas janelas, no dizer de Riobaldo, são como “a alegria de um pobre caminhozinho, no dentro de ferro de grandes prisões”.
São janelas que propõem-se ao deslocamento das visadas certeiras; elas são aberturas e possiblidades. Elas permitem a ideia de vários sertões, onde tudo é misturado, onde tudo se transforma,e de um mundo à revelia, que escapa à razão, mas a que nos é dado a tocar, ouvir, ver e perceber, como signo e sentimento. Na voz de Riobaldo um convite se faz a quem as espreita: “Me dê um silêncio. Eu vou contar”.
A exposição fica aberta à visitação no Museu Casa Guimarães Rosa de 08 de dezembro de 2021 a 25 de fevereiro de 2022.
Museu Casa Guimarães Rosa | Av. Padre João, 744 - Cordisburgo, MG, 35780-000
Tel: (31) 99618-3291
Horário de visitação: de terça-feira a domingo das 09h30 às 17h
Observação: no último domingo de cada mês o Museu fica fechado
Com informações de Museu Casa Guimarães Rosa
Fotos de Ronaldo Oliveira
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